quarta-feira, 25 de abril de 2012

Ámen

          A ideia era boa, quase óptima, viajar para o meio do nada e enchê-lo com aquilo que tenho de fazer; que quero fazer; que sou feliz a fazer. Encher apenas um bocadinho do nada enorme lá fora, e escrever. Precisa de respirar, a escrita; e eu também.
          Sentei-me num cantinho do nada - bem no cantinho para não o sufocar - e o nada que julgava meu, encheu-se com a vida do Sr. António - chamemos-lhe assim. O Sr. António tem uma serra eléctrica e lenha para cortar, pouco lhe importa que eu tenha lenha para limar. Costumo zangar-me quando o mundo me troca as voltas, mas hoje não sei como o fazer.
          Morreu Miguel Portas e o nada está irremediavelmente cheio. Não sobra sequer um cantinho onde me possa sentar, e mesmo que sobrasse, seria irrelevante se a escrita respira, quando ele já não.
          Não sobra sequer um cantinho onde eu possa respirar.
          Esperemos que respire por todos nós, o Sr. António.
          Ámen.
          Em nome da mãe, do irmão e da irmã.
          Amem.

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