segunda-feira, 31 de maio de 2010

Rio de Janeiro à sombra

A previsão era de chuva, mas uma manhã de chuva no Rio não implica necessariamente uma tarde de chuva no Rio. Infelizmente hoje implicou.
As nuvens massudas limitaram-se a coar o sol, que tentava em esforço chegar cá abaixo.
O resultado foi um dia leitoso, inundado de uma luz demasiado branca e queimada.
O resultado foi um daqueles dias sem sol em que o uso de óculos de sol é obrigatório. Estranho.
Este foi mais um dia em que o Vento de Leste decidiu fintar os cariocas, dando boleia às nuvens, que em dias sem transporte se acumulam nos morros da Floresta da Tijuca.
Ignorando o mau tempo, saí à rua.
O transporte que o hotel em São Conrado disponibiliza para o Rio Sul Shopping serviu-me de pretexto para ir espreitar o Leblon, Ipanema e Copacabana. Sentei-me no lugar ao lado do condutor para fugir à enxaqueca com que o filtro às bolinhas dos vidros laterais da carrinha, me costuma presentear.
- Bom dia! Posso tomar esse lugar aqui do seu lado? Perguntei. (convém sempre dar um toque "abrasileirado" à coisa, senão a resposta certa é: oi?!)
- Claro! Respondeu-me com um sorriso largo.
Pus o cinto, respeitei o aviso que gritava em letras gordas: POR FAVOR NÃO FALE COM O MOTORISTA e fiz a viagem em silêncio a olhar o cinzento lá fora.
Em Ipanema, apenas duas senhoras corajosas insistiam em cumprir o ritual diário do exercício físico, porém hoje faziam-no com uma mão na cabeça a segurar o chapéu de que não precisavam para as proteger do sol. Um único vendedor de cangas saiu à rua. Um par de pernas esqueléticas espreitava sufocado por baixo de um monte de trapos que o Vento de Leste insistia em emaranhar. O frenesim habitual e colorido de gente em biquini ou em roupa de malhação, na praia e no calçadão, foi substituido por um bando de pombos encardidos que descansavam em paz na areia, sem viva alma para os enxotar. A praia foi hoje toda deles.
Já a baía generosa e curvada de Copacabana respirava uma luz mais quente como que a chamar o sol. Por momentos, breves momentos infelizmente, acreditei que o céu ia abrir. O homem de bronze sentado num dos bancos de pedra do calçadão, amarelecia levemente a luz crua à sua volta, porém, também ele estava hoje condenado a conversar sozinho.
Chegámos finalmente ao shopping.
Andei às voltas durante duas horas, a fazer tempo para apanhar o transporte de volta. Apesar de não ter nada para comprar, acabei por meter ao saco uma série de disparates que no momento me pareceram absolutamente essenciais. Aproveitei para "fazer a unha" e dei-me ao luxo de as pintar de "rosa chiclete" numa tentativa frustrada de brincar ao verão.
Duas horas mais tarde tudo se repetiu. A mesma cidade cheia de nada, que é como quem diz vazia de gente e cheia de pombos. As duas senhoras corajosas e os seus magnificos chapéus estavam já de volta ao conforto dos seus ap's, as cangas com pernas deram-se conta de que o negócio estava fraco e optaram por regressar ao desconforto da rocinha e o sr. de bronze, esse, continua para lá à espera de companhia.
Porém tudo vai mudar em breve.
Logo à noite, quando a escuridão render as nuvens à irrelevância, voltaremos a ter verão no Rio. Até lá, aguardamos à sombra.

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