sábado, 12 de junho de 2010

Para ti, claro...

Era um sábado igual a tantos outros.
O sol não tinha ainda nascido, deixando à imaginação de cada um, a árdua mas deliciosa tarefa de adivinhar o que mais um dia de inverno poderia reservar.
Nada faria supor que esta madrugada aparentemente igual a tantas outras, fosse o início de uma vida, antes de um sonho. Quando digo “nada faria supor”, leia-se por favor “tudo faria supor”, pois o encanto do desconhecido, do incerto é exactamente a possibilidade que nos é oferecida, a nós comuns mortais, de flutuarmos sem limites através da imensidão etérea, embora por vezes tão real, tão palpável, do irreal. Considerando o irreal tudo o que excede os limites da realidade que o senso comum se permite abarcar, resta-nos um mundo sem fim, onde finalmente o céu pode ser vermelho, para enorme angústia de muitas educadoras de infância que durante anos se dedicaram a condicionar o pensamento solto e desprovido de preconceitos das ingénuas crianças, dizendo-lhes que o céu é azul. Provavelmente, e esta é a única explicação plausível que encontro para este fenómeno, sem nunca terem de facto, observado cuidadosamente o céu.
Por esta altura, já o sol se esforçava por desenhar o seu caminho por entre o céu cinzento e congestionado. O esforço para alcançar a superfície molhada da cidade era evidente. O duelo travado entre os raios quentes e a voluptuosidade de toda aquela água condensada, deixava no ar um rasto de esperança, como se nos dissessem que o aparentemente inatingível, afinal não o é.
Romperam então juntos o manto denso, antecipando-se e subvertendo a lei natural das coisas onde está escrito que é o sol que procura o homem e não o contrário. Foi como se tivessem encontrado finalmente o lugar ideal para amar, longe das pesadas amarras terrenas que lhes prendiam demasiado os movimentos. Podiam finalmente ir ao encontro dos seus mais íntimos desejos, sem ter antes de resolver uma série de equações matemáticas, só que mais complicadas, pois no lugar de números existem pessoas que vivem, pensam e acima de tudo também sentem.
Foi como um sonho.
Os seus olhares cruzavam-se em conversa e as palavras escutadas não eram mais que as indispensáveis à confirmação do que os olhos de ambos diziam.
...
...
Este é um texto escrito em 2003.
Este é um texto inacabado desde 2003.
Este foi até hoje um texto à procura de bainha que o rematasse.
Hoje é apenas um texto de 2003, inacabado mas que não deseja fecho, porque tudo ficou afinal em aberto.

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